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4 -Wywanyag Wachipi

4 -Wywanyag Wachipi

Wiwanyag Wachipi – A DANÇA DO SOL
Livro: Blsck Elk Speaks

A «dança que olha o sol» – wiwanyag wachipi – é um de nossos maiores rituais e foi instituído muitos invernos depois que nosso povo recebeu o Chanumpa da Mulher Bisão Branco.

É realizado todos os anos durante a lua da engorda (junho) ou a lua das cerejas que enegrecem (julho), sempre na lua cheia, porque o crescimento e a diminuição da lua nos recorda nossa ignorância que vai e vem; mas quando a lua está cheia é como se a Luz eterna do Grande Espírito estivesse estendida por todo o mundo.

Mas agora quero contar como este ritual chegou a nosso povo e como se realizou na origem.

 

Um dia, nosso povo acampava em um lugar propicio, em círculo como sempre, e os anciãos estavam sentados celebrando o conselho; logo observaram que um de nossos homens, Kablaya – Aquele Que Se Estica -, havia deixado cair seu manto até a cintura e dançava só a certa distancia com as mãos erguidas para o céu.

Os anciãos pensaram que talvez estivesse louco e enviaram alguém para ver o que estava acontecendo; mas o enviado enrolou também o manto na cintura e começou a dançar com Kablaya.

Achando a coisa estranha, os anciãos foram ver por si mesmos.

Então Kablaya lhes explicou:

Faz muito tempo, o Grande Espírito nos disse como devíamos rezar com o Chanumpa sagrado; mas nós temos relaxado na prática da reza e nossa gente perde vigor.

Uma nova maneira de rezar acaba de me ser revelada em uma visão; o Grande Espírito veio em nossa ajuda.

Ao ouvir estas palavras, todos os anciãos exclamaram: How! e mostraram uma grande alegria.

Celebraram conselho e enviaram dois homens ao guardião do Chanumpa sagrado, a quem correspondia dar sua opinião sobre as questões deste gênero.

O guardião respondeu aos mensageiros dizendo que se tratava certamente de algo muito bom; porque nos foi prometido que teríamos sete maneiras de rezar ao Grande Espírito, e esta é seguramente uma delas, já que Aquele Que Se Estica recebeu instruções sobre ela em uma visão; pois bem, assim é como nos foi dito que receberíamos nossos ritos.

Os dois mensageiros transmitiram estas noticias aos anciãos, que pediram a Kablaya que lhes instruísse sobre o que teriam de fazer.

Ele disse então:

Esta será a Dança do Sol: não podemos fazê-la em seguida, pois devemos esperar quatro dias, que dedicaremos aos preparativos, tal como me foi ensinado em minha visão.

Esta dança será uma oferenda de nossos corpos e nossas almas ao Grande Espírito, e estará cheia de mistério.

Que se reúnam todos os nossos homens sábios e anciãos; que se construa um grande pavilhão e que se adorne seu interior com salvia.

Necessitamos também um Chanumpa e os seguintes objetos:

Um rolo de tabaco da tribo dos arikara; casca de salgueiro vermelho; erva aromática; uma faca de osso; um machado de pedra(sílex); medula de bisão; um crânio de bisão; uma bolsa de couro cru; uma pele curtida de bisão jovem; peles de coelho; plumas de águia; pintura de terra vermelha; pintura azul; uma pele sem curtir; plumas do peito de uma águia; apitos feitos de ossos de águia pintada.

Quando todos estes objetos rituais estavam reunidos, Kablaya pediu aos que sabiam cantar que fossem até sua casa naquela mesma noite para aprender os cantos revelados; avisou que também deviam trazer um grande tambor feito de pele de bisão, e também umas baquetas com a ponta recoberta de pele de bisão com o lado do pelo virado para fora.

Como o tambor é com frequência o único instrumento que utilizamos em nossos ritos, deverei lhes explicar agora por que é particularmente venerável e importante para nós: é porque a forma redonda do tambor representa o Universo e seu toque regular e forte é o pulso, o coração que bate no centro do Universo.

É como a voz do Grande Espírito, e este som nos põe em movimento e nos ajuda a compreender o mistério e o poder de todas as coisas.

Naquela noite, os cantores, quatro homens e uma mulher, se juntaram a Aquele Que Se Estica, que lhes falou nestes termos:

Ó parentes meus, durante muito tempo temos enviado nossas vozes ao Grande Espírito. Isto é o que Ele nos disse para fazer.

Lhe pedimos de muitas maneiras e graças a esta santa maneira de viver, nossas gerações têm aprendido a caminhar pelo caminho vermelho com passo firme.

O Chanumpa está sempre no centro de nossa nação e com ele o povo tem avançado e continuará avançando de uma maneira conforme ao mistério.

Neste novo rito que acabo de receber, um dos povos que estão sempre de pé foi escolhido para estar no nosso centro: é o wagachun, a árvore murmurante, o álamo; ele será nosso centro e também nossa tribo. Esta árvore sagrada representará também o caminho do povo, porque, não se eleva a árvore desde a terra até o céu?.

Esta nova maneira de enviar nossas vozes ao Grande Espírito será muito poderosa; seu uso se difundirá, e todos os anos, durante esta estação, muita gente rezará ao Grande Espírito. Antes de ensinar os cantos sagrados, vamos oferecer o Chanumpa a nosso Pai e Avô Wakan Tanka.

Ó Avô e Pai Wakan Tanka, vamos cumprir tua vontade como nos ordenou em minha visão.

Sabemos que será uma maneira muito poderosa de enviar nossas vozes; que nossa nação receba, graças a ela, a sabedoria! que nos ajude a avançar pelo caminho sagrado com todos os Poderes do Universo!

Nossa reza será verdadeiramente a reza de todas as coisas, porque na realidade todas elas não são mais que uma.

Tudo isto foi visto em minha visão.

Que os quatro Poderes do Universo nos ajudem a realizar bem este ritual!

Ó Wakan Tanka, tenha piedade de nós!

Todos fumaram do Chanumpa e depois Kablaya se começou a lhes ensinar os cantos misteriosos.

Ao redor dos cantores se reuniram muitas outras pessoas, e Aquele Que Se Estica lhes disse que enquanto escutavam deviam gritar de vez em quando: Ó Avô Wakan Tanka, Te ofereço o Chanumpa para que meu povo viva!

O primeiro canto que ensinou o profeta era sem palavras; era uma simples melodia que se repetia quatro vezes com um forte retumbe de tambor.

As palavras do segundo canto eram as seguintes:

Wakan Tanka tenha piedade de nós, Para que nosso povo viva.

O terceiro :

Chega uma manada de bisões,

Já estão aqui!

Sua benção nos alcançará.

Já está conosco!

 

O quarto canto era uma melodia sem palavras.

 

Depois Kablaya ensinou aos homens o modo de utilizar os apitos de osso de águia

que haviam trazido; lhes indicou, ainda, as coisas que deviam preparar e explicou o significado de cada objeto ritual:

Fareis um colar de pele de lontra nele colocará um aro com uma cruz inscrita.

Nos quatro pontos em que a cruz se junta com o aro se colocam umas plumas de águia que representarão os quatro Poderes do Universo e as quatro idades.

No centro do aro fixaras uma pluma arrancada do peito da águia, porque este é o lugar mais próximo ao coração da ave sagrada.

Esta pluma representará o Grande Espírito que mora nas profundidades dos Céus e que é o centro de todas as coisas.

Devem procurar apitos de osso de águia; e por uma pluma no extremo de cada um.

Ao soprar vossos apitos lembrem sempre de que é a voz da Águia Pintada e de que nosso Avô Wakan Tanka a ouve constantemente; devem compreender que é realmente sua própria voz.

 

Recortarão uma lua, em forma de quarto crescente, em uma pele sem curtir; a lua representa uma criatura e também todo o criado, porque todas as coisas criadas se fazem e se desfazem, vivem e morrem.

Devem compreender, também, que a noite representa a ignorância, mas que a lua e as estrelas trazem a luz do Grande Espírito a estas trevas.

Como sabem, a lua vai e vem, mas o sol vive sempre; ele é a fonte da luz, e por esta razão é semelhante ao Grande Espírito.

Recortarão em uma pele sem curtir uma estrela de cinco pontas.

Será a estrela sagrada da alma, que está entre a obscuridade e a luz, e que representa o Conhecimento.

Farão um círculo de pele sem curtir que represente o sol; estará pintado de vermelho, mas o centro será um círculo azul, porque este centro, que é o mais íntimo, representa o Grande Espírito em seu aspecto de Avô nosso.

A luz deste sol ilumina a todo o Universo, e da mesma forma as chamas do sol nos chegam com a aurora, assim também desce sobre nós a Luz do Grande Espírito, que ilumina a todas as criaturas.

Esta é a razão pela qual os quadrúpedes e os seres alados se alegram quando aparece a luz.

Durante o dia podemos ver, e esta visão é algo profundo, porque representa a visão do Mundo real que podemos obter através do Olho do coração.

Ao levar este sinal misterioso durante a dança, recordamos de que trazemos luz ao Universo, e obterás um grande proveito se os concentrar nestes diversos significados.

Recortarão um redondo, que será pintado de vermelho e representará a Terra.

A Terra está cheia de mistério, porque nela colocamos os pés e dela enviamos nossas vozes ao Grande Espírito. É parenta nossa e sempre que a chamamos Avó e Mãe devemos nos recordar dele. Quando rezamos, levantamos a mão para o céu e depois tocamos o solo; por acaso nosso espírito não vem do Grande Espírito e nossos corpos da Terra?

Somos parentes de todas as coisas: a terra, as estrelas, todos elevamos a mão para o Grande Espírito e só rezamos a Ele.

Recortarão também um círculo em uma pele sem curtir e a pintarão de azul para representar o céu. Quando dançar, levantarão a cabeça e a mão para o Céu, e o olharão, porque se fizerem isso, nosso Avô os verá. Ele é o dono de tudo; não há nada que não lhe pertença, e por tanto só a Ele rezarão.

Por último, recortarão em uma pele sem curtir a forma de tatanka, o bisão: representa a nação, e também o Universo, e deve ser tratado sempre com respeito; não estava ele aqui antes que os povos bípedes, e acaso não se mostra generoso a nos proporcionar nossas tendas e nosso alimento?

O bisão é sábio em muitas coisas e, por isso, devemos aprender dele e saber sempre que estamos aparentados com ele. Cada homem levará um destes símbolos sobre seu peito e será consciente de seu significado, tal como acabo de lhes explicar.

Neste grande ritual vocês irão oferecer vosso corpo em sacrifício em nome de toda a tribo; graças a vocês, a tribo ganhará em sabedoria e em força. Sejam sempre conscientes destas coisas que hoje eu disse; são sagradas. No dia seguinte teria de ser escolhida a árvore murmurante que devia levantar-se no centro do grande recinto; Aquele Que Se Estica disse a seu ajudante que tipo de árvore devia buscar e para a marcar com salvia para que os guerreiros pudessem localizá-la e leva-la ao acampamento. Lhes indicou também como teriam que delimitar o terreno ao redor da árvore sagrada, é nele que se construirá o pavilhão ritual da dança do sol, e como teriam que assinalar com ramos verdes a entrada do Leste.

Os exploradores, designados pelos homens santos, foram a escolher uma boa árvore; uma vez que o fizeram, regressaram ao acampamento e, depois de dar a volta no sentido do movimento do sol no local onde se construiria o pavilhão, se precipitaram para a entrada, tratando de lhe acertar um golpe.

Em seguida pegaram um Chanumpa e, depois de oferecê-lo para as seis Direções, juraram dizer a verdade. Aquele Que Se Estica falou então aos homens:

Pegaram o Cachimbo santo; por conseguinte, devem nos contar verdadeiramente o que viram. Sabem que ao longo da haste do Cachimbo há um caminho que vai direto ao centro e ao coração do Chanumpa; que vossos pensamentos sejam tão retos como este caminho. Que vossas línguas não estejam, fendidas.

Se os enviei para que encontrem uma árvore que será de muito proveito para nossa nação; nos contem, fielmente, o que foi encontrado. Então o profeta fez quatro vezes um movimento circular com o Chanumpa e dirigiu a haste para o explorador que ia fazer o relato. Subi uma colina e vi ali um grande número destes povos sagrados que estão sempre de pé. Em que direção olhava, e o que viu atrás da primeira colina?

Estava de frente para o Oeste – respondeu o explorador -, continuei adiante e olhei mais além da segunda colina; e vi muito mais povos dos que estão sempre de pé que viviam ali.

O explorador foi interrogado desta maneira quatro vezes; como devem saber, todas as coisas boas são quatro vezes; além disso, quando vamos pelo caminho da guerra sempre interrogamos deste modo a nossos exploradores; pois bem, nós consideramos esta árvore como um inimigo a quem vamos matar. Depois que os exploradores nos informaram, todos se vestiram como se fossem ir pelo caminho da guerra; depois saíram do acampamento como se fossem atacar um inimigo.

Muitos homens seguiram os exploradores, e quando estavam perto da árvore escolhida todos se juntaram ao seu redor. Aquele Que Se Estica chegou por último com seu Chanumpa; ergueu a haste em direção para a árvore e falou assim: Entre os numerosos povos que estão sempre de pé, ó álamo sussurrante, foi escolhido de uma maneira conforme ao mistério; ira ao centro sagrado da nação; representarás a tribo e nos ajudará a cumprir a vontade do Grande Espírito. És uma árvore benévola e de bela aparência; os povos alados tem criado suas famílias sobre ti; em ti, desde a ponta de teus ramos altivos até tuas raízes, os povos alados e os quadrúpedes tem feito suas moradas.

Quando for levantada no centro do círculo sagrado será a nação, e será como o Chanumpa, estendido entre o céu e a terra. Os débeis se apoiarão em ti e será um suporte para a tribo. Com a ponta de teus ramos sustentará os dias sagrados vermelho e azul.

Se levantará onde se cruzam os quatro caminhos de mistério, ali tu serás o centro dos grandes Poderes do Universo. Que os homens sigam sempre teu exemplo, porque vemos como olhas constantemente para o céu. Logo, com todos os povos do mundo, te levantará no centro; trarás o bem a todos os seres e a todas as coisas. Hechetu welo!

O profeta ofereceu em seguida seu Chanumpa ao Céu e à Terra, com a haste tocou a árvore pelo lado Oeste, Norte, Leste e Sul; em seguida acendeu o Chanumpa e fumou. Creio que devo explicar agora porque consideramos sagrado o álamo. Para começar direi que, em tempos muito remotos, ele nos ensinou a construir nossas tendas cônicas, já que suas folhas são um modelo exato da tipi; aprendemos assim: uns anciãos observaram uns meninos que confeccionavam com estas folhas umas cabanas para brincar.

Isto é, também, um exemplo de que os adultos podem sempre aprender dos pequenos, porque os corações dos pequenos são puros; o Grande Espírito pode lhes mostrar muitas coisas que passam despercebidas aos maiores. Outra razão pela que escolhemos o álamo para o colocar no centro de nosso pavilhão, é que o Grande Espírito nos ensinou que, ao cortar um membro superior desta árvore, aparece na fibra uma perfeita estrela de cinco pontas, a qual representa para nós a presença do Grande Espírito.

Quem sabe você já tinha notado que a voz do álamo é ouvida inclusive com a brisa mais tênue; compreendemos que isto é sua reza ao Grande Espírito, porque não só os homens, mas todas as coisas e todos os seres rezam continuamente, ainda de formas diferentes.

Os chefes fizeram uma dança da vitória ao redor da árvore, cantando seus cantos de chefe, e enquanto cantavam e dançavam escolheram o homem que teria a honra de tocar a árvore com a lança; este homem deve ter um bom caráter e tem que se ter mostrado valente frente o sacrifício de si mesmo no caminho da guerra. Desta forma foram eleitos três mais, e cada um destes quatro homens se situou de um dos quatro lados da árvore, com o guia a Oeste.

Este último contou então suas façanhas guerreiras e quando terminou os homens o aclamaram e as mulheres lançaram trêmulos; depois ameaçou três vezes a árvore com seu tomahawk, e na quarta a golpeou.

Depois dele, os outros três bravos relataram por sua vez suas proezas na guerra, e quando terminaram golpearam a árvore do mesmo modo, e a cada golpe que davam as pessoas exclamavam: Hi hey!

Quando a árvore estava a ponto de cair, os chefes se misturaram com a multidão e elegeram uma pessoa de caráter tranquilo e piedoso, que deu o último golpe na árvore; sua queda foi saudada com aclamações e as mulheres fizeram o trêmulo. Foram tomadas grandes precauções para que ao cair, o tronco não tocasse o solo, e ninguém estava autorizado a passar por cima dele.

Em seguida, seis homens transportaram a árvore ao acampamento, mas, antes de chegar a ele se detiveram quatro vezes; depois da última parada imitaram o grito do coiote, tal como fazem os combatentes que regressam do caminho da guerra; depois se precipitaram ao acampamento e depositaram a árvore sobre umas estacas – já que não deve tocar o solo – e com a base dirigida para o buraco que havia sido preparado, e a copa para o Oeste.

Ainda não se havia levantado o pavilhão ao redor da árvore, mas já estavam prontas todas as varas e o equipamento necessário para o construir. Então Aquele Que Se Estica, junto contou os que iam participar na dança, se dirigiu a uma grande tenda; lhes deu instruções, e elos se prepararam para o ritual. A tenda foi fechada completamente, e inclusive foram postas folhas ao redor de sua base. Kablaya, profeta e grande homem santo, se encontrava sentado a Oeste. Em primeiro lugar escavou o solo a sua frente e mandou colocar uma brasa naquele local; acendeu nela erva aromática e disse:

Queimamos esta erva para o Grande Espírito, a fim de que todos os povos bípedes e alados do Universo sejam parentes próximos. E assim haverá muita felicidade. Em seguida foi construído um pequeno modelo de secador de carne com três paus, dois aforquilhados cravados no solo e um reto posto encima, e os pintaram de azul; porque o secador de carne representa o céu, e nós rezamos para que nossos secadores estejam sempre tão cheios como os céus.

Logo, depois de purificar com a fumaça, se apoiou o Cachimbo no secador, porque desta forma representa nossas rezas; ela é o caminho que leva da terra ao Céu.

Todos os objetos que seriam utilizados na dança foram então purificados na fumaça da erva aromática: as figuras de pele, as pinturas, a pele de bezerro, as bolsas de couro; e também se purificaram os dançarinos. Quando tudo isto estava feito, o grande homem santo levantou seu Chanumpa para o céu e rezou:

 

Ó Avô Wakan Tanka, Tu és o Criador de todas as coisas!

Tu foste sempre e será sempre.

Mostraste-te bom com teu povo, porque nos ensinou uma forma de rezar com o

Cachimbo que nos deste; e agora me mostrou em uma visão a dança de mistério que ensinarei a meu povo.

Hoje queremos fazer tua vontade.

Em pé sobre esta Terra sagrada sobre a qual as gerações de nosso povo têm vivido, envio uma voz para Ti oferecendo este Cachimbo.

Me veja, ó Wakan Tanka, porque represento ao povo inteiro.

Neste Chanumpa quero colocar aos quatro Poderes e a todos os seres alados do

Universo; junto com eles, que não serão mais que um só, quero Te enviar uma voz.

Veja-me e Ilumina meu pensamento com tua luz imortal!

Ofereço este Chanumpa ao Grande Espírito, primeiro contigo, ó Poder alado do lugar onde se põe o sol; há um lugar para ti neste Chanumpa: ajude-nos com estes dois dias, vermelho e azul, que santificam a nação!

Aquele Que Se Estica pegou então uma pitada de tabaco, e depois de mostrá-la ao

Céu, à Terra e às quatro Regiões, a colocou no fornilho; em seguida, ao mesmo tempo em que pronunciava as rezas que vou dizer, colocou no Chanumpa um pouco de tabaco para cada uma das demais Direções:

Ó Poder alado do lugar onde vive Wazia, vou oferecer este Chanumpa ao Grande Espírito: ajude-me com os dois dias bons, o vermelho e o azul, que Tu possuis dias que purificam ao povo e ao Universo.

Há um lugar para Ti no Chanumpa, ajude-nos!

Ó Poder do lugar onde sai o sol, que dá o conhecimento e cuidas da aurora do dia, ajude-nos com teus dois dias vermelho e azul que dão a compreensão e a luz.

Há um lugar para Ti neste Chanumpa que vou, oferecer ao Grande Espírito ajude-nos!

Ó Poder santíssimo do lugar para onde sempre voltamos, Tu que és a fonte da vida, que guarda a nação e as gerações futuras, ajude-nos com teus dois dias vermelho e azul! Há um lugar para Ti no Chanumpa.

Ó Águia Pintada do Céu, sabemos que possuis olhos penetrantes que vêem até omenor objeto que se move sobre a Avó Terra; Tu que está nas alturas do Céu e sabe tudo, ofereço este Chanumpa ao Grande Espírito! Nos ajude com teus dois dias bons vermelho e azul!

Ó Avó Terra, que está estendida sustentando a todas as coisas, sobre Ti se levanta um homem que oferece um Chanumpa ao Grande Espírito.

Tu estás no centro dos dois bons dias vermelho e azul, há um lugar para Ti no

Chanumpa, nos ajude!

 

O profeta e grande homem santo colocou então um pouco de tabaco no Chanumpa para cada uma das aves seguintes: o papa-moscas, o peito vermelho, a cotovia, que cantam nos dois dias bons; o pássaro carpinteiro, o gavião, que faz a vida tão difícil aos demais povos alados; o falcão, a coruja, que sabe tudo; o melro, e muitos outros pássaros; de forma que todos os objetos da criação e as seis Direções do espaço foram introduzidos no fornilho do Chanumpa; então ela foi selada com banha e medula de bisão, e apoiada no pequeno secador azul.

O profeta pegou então outro Chanumpa, o encheu e se dirigiu para onde repousava o árvore sagrada. Trouxeram uma brasa, e a árvore e o buraco foram purificados com a fumaça da erva aromática.

Wakan Tanka! rezou Aquele Que se Estica elevando seu Chanumpa com uma mão, veja esta árvore misteriosa que logo será colocada nesse buraco! Se erguerá junto com o Chanumpa sagrado; será o Chanumpa!

A toco com a cor vermelha poderosa de nossa Avó e com a banha do bisão quadrúpede, ao tocar este ser árvore com a terra vermelha, nos recordamos de que as gerações de tudo quanto se move provêem de nossa Mãe Terra.

Com tua ajuda, ó árvore, logo oferecerei meu corpo e minha alma al Grande Espírito, e comigo, em mim, ofereço meu povo e todas as gerações futuras!

O grande homem santo pegou então a pintura vermelha, a ofereceu às seis Direções e se dirigiu novamente a árvore sagrada:

Ó árvore, vai se colocar em pé, seja misericordiosa com meu povo para que, embaixo de ti, prospere!

Então pintou uma linha vermelha nos lados Oeste, Norte, Leste e Sul da árvore, e fez na parte mais alta uma marca bem pequena para o Grande Espírito; em seguida colocou na base um pouco de pintura para a Mãe Terra.

Por último, pegou uma pele de bisão jovem e disse:

 

Nossa nação vive deste ser bisão; ele nos proporciona nossas tendas, nossas roupas, nosso alimento, tudo o que nos faz.

Ó jovem bisão, te dou agora um lugar sagrado encima da árvore.

Ela te terá em suas mãos e te elevará para o Grande Espírito.

Veja o que vou fazer!

 

Graças a ele, todas as coisas que se movem e que voam na terra e no céu serão felizes.

E levantou um pequeno broto de cereja e continuou rezando:

Veja isto, ó Wakan Tanka, porque é a árvore da nação e pedimos para que tenha fruto abundante.

Colocaram arvorezinha no álamo sagrado, logo abaixo da pele de bisão, assim como também um saquinho de pele de lontra que continha um pouco de sebo. Kablaya levantou então as imagens de couro de bisão e de homem, e as oferecendo

às seis Direções, pediu:

 

Veja, ó Avô, este bisão que nos deste; ele é o chefe de todos os quadrúpedes que há sobre nossa Mãe sagrada; a nação vêm dele, e com ele caminha pelo caminho de mistério.

Veja, também, ao homem que representa a tribo.

Eles são os dois chefes desta grande ilha; pedimos que lhes conceda todos os favores que te pedem, ó Wakan Tanka!

Estas duas imagens se colocam logo abaixo do lugar onde a árvore se bifurcou; em seguida o profeta levantou um saquinho de sebo – que será posto mais tarde embaixo da árvore – e rezou assim:

 

Ó Avô Wakan Tanka, veja este sebo sagrado sobre o que este ser árvore se levantará, que a terra seja sempre tão fértil e fecunda como este sebo!

Ó árvore, este dia é sagrado para ti e para todos os nossos; a terra deste círculo te pertence, ó árvore, e é aqui, debaixo de ti, onde vou oferecer meu corpo e minha alma por amor à tribo.

Aqui estarei te enviando minha voz, ó Wakan Tanka, com a oferenda do Chanumpa de mistério.

Tudo isto é sem dúvida muito difícil de fazer, mas deve se cumprir, pelo bem de todos.

Ajude-me, ó Avô, e me de valor e força para suportar os sofrimentos que me esperam.

Ó árvore, és agora admitida no pavilhão.

Entre muitas exclamações e trêmulos estridentes, a árvore foi posta em pé bem lentamente, porque os homens se detiveram quatro vezes antes de pô-la erguida e a deslizar para o buraco preparado para ela. Todo o mundo, os bípedes, os quadrúpedes e os seres alados se alegraram; todos iam prosperar embaixo da proteção da árvore. Ela nos ajudará a ir pelo caminho sagrado; podemos nos apoiar nela, e ela nos guiará e fortalecerá sempre.

Foi feita uma dança em torno da base da árvore, e se começou a construir o recinto a seu redor cravando um amplo círculo com vinte oito postes aforquilhados, encima de cada um dos quais foi posto uma vara que ia se unir com a árvore, situada no centro.

Devo explicar agora que, ao edificar o pavilhão da dança do sol, construímos realmente uma imagem do Universo; porque deves compreender que cada um dos postes representa algum objeto particular da criação, de forma que o círculo completo é a criação inteira, e a árvore única do centro, sobre ela que descansam as vinte oito varas, é o Grande Espírito, que constitui o centro de todas as coisas. Tudo provêm Dele, e tudo regressa a Ele cedo ou tarde.

Tenho que dizer também por que empregamos vinte oito varas: já vos expliquei a razão dos números quatro e sete serem sagrados; se contar quatro vezes sete, obterá vinte oito. A lua vive vinte oito dias, que formam nosso mês; cada um destes dias representa algo que para nós é sagrado.

Dois destes dias representam o Grande Espírito; outros dois Mãe Terra; quatro, os quatro Ventos; um dia, a Águia Pintada, outro o sol e outro a lua; há um dia para a Luz da aurora e quatro dias para as quatro idades; sete dias representam nossos sete grandes ritos, um dia o bisão, um dia o fogo, um o água, outro a rocha e, por último, um dia representa o povo bípede.

Se somar estes dias, obterá um total de vinte oito. Além disso, deves saber que o bisão tem vinte oito costelas, e que em nossos cocares de guerra empregamos normalmente vinte oito plumas. Como vê, todas as coisas têm seu significado, e é bom saber e recordar disso. Mas voltemos à dança do sol. Os guerreiros se vestiram e se pentearam. Entraram no recinto e dançaram ao redor da árvore central; deste modo o solo se purificava e se nivelava.

Os chefes se reuniram e escolheram os valentes, um dos quais ia ser o diretor da dança. Estes homens escolhidos dançaram avançando primeiro para o Oeste e voltando ao centro, depois para o Norte e novamente ao centro, depois para o Leste e regressando outra vez ao centro, Cabana da Dança do Sol e finalmente para o Sul e de novo ao centro; deste modo fizeram um caminho em forma de cruz. Mas antes de realizar a dança do sol, os homens tinham que se purificar na cabana de suar. O profeta entrou em primeiro lugar na cabana do inipi com o Chanumpa já carregado, e se sentou a Oeste; os demais homens que iam participar na dança entraram em seguida, evitando passar pela frente dele; a última a entrar foi uma mulher, que se sentou perto da porta. Todas as roupas de pele de bisão que seriam usadas na dança foram colocadas encima da cabana do inipi, porque assim se purificariam. As cinco pedras aquecidas que representavam às cinco Direções foram então introduzidas e colocadas sobre o altar em seu lugar respectivo, depois do qual se pos no caminho ritual uma sexta pedra. Aquele Que Se Estica pegou o Chanumpa que devia servir para a dança; mas para o ritual de inipi se encheu um segundo Chanumpa, que foi dado ao grande homem santo para que o benzer e o acender.

Este Cachimbo foi fumado de maneira ritual, e depois de purificado a levaram para fora da cabana. Se fechou a porta; era o momento em que o profeta explicaria ao povo sua visão:

Parentes meus, me escutem todos!

O Grande Espírito tem sido bom conosco e nos estabeleceu em uma terra sagrada; nela estamos sentados agora.

Acabam de ver as cinco pedras colocadas no centro, e esta sexta pedra que foi posta no caminho representa a nação.

Para o bem de todos nós, o Grande Espírito me ensinou em uma visão uma maneira de adoração que vou lhes ensinar. Os céus são sagrados, porque neles vive nosso Avô, o Grande Espírito; estes céus são como um manto para o Universo; este manto está agora sobre mim, que estou aqui frente vocês.

Ó Wakan Tanka, Te mostro o círculo de nossa nação, este círculo que está aqui e nele há uma cruz; esta cruz é levada por um de nós sobre o peito.

E Te mostra a Terra que Tu fizeste e que fazes sem cessar; está representada por este círculo vermelho que levamos.

Também levamos a luz inextinguível que muda a noite em dia, a fim de que esteja entre os nossos e eles possam ver.

Te mostro também o luzeiro do alvorecer, que nos da o conhecimento.

O bisão quadrúpede que puseste aqui abaixo antes que os bípedes está também conosco.

E igualmente está aqui a mulher celeste que veio a nós de um modo tão misterioso.

Todos estes povos e estas coisas, que são santas, escutam neste momento o que digo.

Logo, junto com meus parentes que se encontram aqui, sofrerei e suportarei grandes penas em favor de meu povo.

Em meio das lágrimas e o sofrimento elevarei meu Chanumpa e lançarei minha voz para Ti, ó Wakan Tanka!

Oferecerei meu corpo e minha alma para que meu povo viva.

Ao Te enviar minha voz, ó Wakan Tanka, utilizarei o que une a Ti às quatro Regiões, ao Céu e à Terra.

 

Tudo quanto no Universo se move, os quadrúpedes, os insetos, os seres alados, se alegram e nos ajudam, a mim e a minha tribo.

E entoou um canto de mistério:

Ouço vir ao sol, a luz de mundo, Vejo seu rosto enquanto chega, Faz felizes aos seres da terra, e eles se alegram, Ó Wakan Tanka, Te ofereço este manto de luz!

O Chanumpa que seria usado na dança foi então envolto em salvia e a mulher o tirou da cabana; o levou pele caminho sagrado para o Leste e o colocou encima do crânio de bisão, cuidando que a haste ficasse dirigida para o Leste.

 

A mulher ficou fora da cabana de suar e ajudou a abrir e fechar a porta. O inipi começou então da maneira que já descrevi. Depois de se fechar a porta pela segunda vez, o profeta rezou assim:

Avô Wakan Tanka, nos veja!

O Chanumpa sagrado que nos deste e com o que temos criado a nossos filhos logo irá ao centro do Universo, junto com o bisão que ajudou a fortalecer nossos corpos.

A mulher de mistério que veio nos tempos antigos ao centro de nosso círculo voltará a nosso centro; e um homem que sofrerá por seu povo irá igualmente ao centro.

Ó Wakan Tanka, que quando estivermos todos no centro, não tenhamos em nossos pensamentos e em nossos corações mais que a Ti!

E cantou então outro canto que havia recebido em sua visão:

O ouço vir. Vejo seu rosto.

Teu dia és sagrado. Eu Te ofereço.

O ouço vir. Vejo seu rosto.

Naquele dia sagrado, Insiste em me rodear o bisão.

Fizeste um dia feliz para o mundo.

Eu Te ofereço todas as coisas.

Em seguida foi derramada água sobre as pedras ardentes enquanto o grande homem santo rezava:

Ó Wakan Tanka, neste momento nos purificamos para ser dignos de elevar nossas mãos para Ti!

Então, levantando sua mão direita, todos os homens cantaram:

Avô, Te envio uma voz.

Avô ,Te envio uma voz.

Junto com todo o Universo, Te envio uma voz.

Para que eu viva.

Quando se abriu a porta pela terceira vez, os homens puderam beber um pouco de água, mas esta foi a única vezes durante todo o ritual que lhes foi permitido faze-lo.

Enquanto os homens recebiam a água, o profeta lhes disse:

Vos dou a água, mas lembrem-se Daquele que, no Oeste, guarda as águas e também

o mistério de todas as coisas.

Vão beber água, que é vida; não despedissem uma só gota.

Quando terminar, levante a mão para dar graças ao Poder do lugar em que se põe o sol; ele os ajudará a suportar os sofrimentos que vais experimentar.

Se fechou a porta pela última vez, e de novo todos os homens cantaram, enquanto o calor e o vapor os purificava, e quando ao final se abriu a porta todos saíram conduzidos pelo profeta e levantaram a mão para as seis Direções dizendo: Hay ho! Hay ho! Pilamaya ye!

Cada um dos dançarinos tinha um ajudante encarregado de retirar de encima da cabana de suar uma das peles de bisão purificadas e de colocá-la ao redor do seu corpo.

Kablaya pegou então seu Chanumpa, que descansava sobre o crânio do bisão, e voltou com todos os homens ao grande tipi onde haviam se reunido antes da consagração da árvore e antes do ritual do inipi.

O grande homem santo deixou seu Chanumpa apoiado no pequeno secador que havia sido pintado de azul para representar o céu.

Colocou erva aromática sobre uma brasa e todos se purificaram na fumaça sagrada.

Ato seguido, ao tempo que benzia e purificava o tambor e as baquetas, o profeta

disse:

Este tambor é o bisão e irá ao centro.

Tocando o tambor com estas baquetas, é certo que venceremos nossos inimigos.

Todos as roupas e apetrechos foram purificados, assim como os quatro crânios de bisão que um dos homens irá levar cravados em sua carne até que se desprenda.

O profeta explicou aos homens que seus corpos purificados eram agora sagrados e nem sequer podiam ser tocados por suas próprias mãos.

Em consequência os dançarinos deviam levar no cabelo uns palitos com os quais se coçariam, se fosse necessário, e que utilizariam para se pintar com a pintura de terra vermelha.

Kablaya colocou ao redor do pescoço o círculo de couro pintado de azul que representava o Céu, e os demais levaram cada um, um símbolo diferente: o círculo com a cruz, o da terra vermelha, o sol, a lua, o luzeiro da aurora, o bisão; a mulher levava o Chanumpa, já que representava a Mulher Bisão Branco.

Assim mesmo, os homens se puseram peles de coelho sobre os braços e as pernas, porque o coelho representa a humildade, por ser manso, doce e sem presunção, qualidade que todos devemos possuir quando vamos ao centro do mundo.

Por último, os homens se colocaram plumas no cabelo, e uma vez terminados os preparativos o profeta lhes explicou o que tinham que fazer quando estivessem no pavilhão da dança sagrada.

Quando formos ao centro do círculo, todos derramaremos lágrimas, porque devemos saber que tudo o que entra, mediante o nascimento, neste mundo que veem em nosso redor, deve sofrer e suportar dores.

Agora vamos sofrer no centro do círculo sagrado, e por fazê-lo, que tomemos sobre nós uma grande parte do sofrimento de nosso povo!

Cada homem declarou então que sacrifício sofreria e o profeta expressou seu voto em primeiro lugar:

Sujeitarei meu corpo às correias do Grande Espírito que descem até a terra.

Esta será minha oferenda.

Devo dizer aqui que a carne representa a ignorância e, por conseguinte, quando dançamos e nossa carne desgarrada se desprende das correias, é como se nos liberássemos dos laços da carne.

Acontece o mesmo quando se doma um potro: a principio o cabresto é indispensável, mas quando o potro está domado a corda já não é necessária.

Também nós somos como potros quando começamos a dançar, mas logo ficamos dominados e cometidos ao Grande Espírito.

 

O segundo dançarino disse:

Quero unir-me aos quatro Poderes do mundo que o Grande Espírito estabelecido. Neste caso o dançarino estará situado efetivamente no centro, porque se encontrará em meio a quatro postes e o lado direito de seu peito se sujeitará ao poste do Leste, e lado esquerdo ao poste do Norte, o ombro direito ao poste do Sul e o ombro esquerdo ao poste do Oeste.  Dançará nesta posição até que as quatro correias se desprendam de sua carne.

 

O terceiro dançarino fez seu voto:

Quero levar quatro de meus parentes mais próximos, o antigo bisão. O dançarino quer dizer com isso que se fixarão quatro correias a sua espalda, as quais se colocarão quatro crânios de bisão; estas quatro ataduras representam os puxões da ignorância: esta deverá estar sempre detrás de nós, visto que devemos nos girar para a luz da verdade que está frente a nós.

 

O quarto dançarino disse:

Quero deixar doze pedaços de minha carne ao pé da árvore sagrada. Um é para nosso Avô Wakan Tanka, ouro para nosso Pai Wakan Tanka, um terceiro para nossa Avó, a Terra, e um quarto para nossa Mãe, a Terra. Quero deixar quatro pedaços de carne para os Poderes das quatro Direções, abandonarei outro para a Águia Pintada, outro para o Luzeiro da aurora, outro para a lua e, por último, outro para o Sol.

 

O quinto dançarino disse:

Quero fazer uma oferenda de oito pedaços de minha carne: dois serão para o Grande Espírito, dois para a Terra, e quatro para os Poderes das quatro Direções.

 

O sexto dançarino disse:

Quero abandonar na árvore sagrada quatro pedaços de minha carne: um será para o Grande Espírito, outro para a Terra sobre a que caminhamos, um para a nação, a fim de que caminhe com passo firme, e um para os povos alados do Universo.

 

O sétimo dançarino disse:

Quero deixar um pedaço de minha carne para o Grande Espírito e outro para a Terra.

 

O oitavo dançarino, que era a mulher disse:

Quero oferecer um pedaço de minha carne ao Grande Espírito e em favor de todas as coisas que se movem no Universo, para que elas dêem seus poderes à tribo, a fim de que esta avance com seus filhos pelo caminho vermelho da vida. Quando terminaram de se pronunciar, o grande homem lhes disse que se purificariam salpicando o rosto e todo o corpo com salvia, porque vamos nos aproximar agora do lugar sagrado onde se lança a árvore; a árvore é também o Chanumpa que se estende desde o céu até a terra. Temos de ser dignos de ir a este centro.

Todos os membros da tribo haviam se reunido ao redor do pavilhão de mistério; no interior, ao sul, estavam os cantores junto com as mulheres que lhes ajudavam, e todos levavam coroas de folhas na sua frente e tinham nas mãos raminhos de plantas sagradas.

Então chegaram os dançarinos conduzidos pela mulher que levava o Chanumpa e seguidos pelo profeta que levava o crânio de bisão, e ao final desta fila vinham os ajudantes com todos os apetrechos. Caminharam lentamente ao redor do pavilhão imitando o movimento do sol e chorando lastimosamente sem cessar:

Ó Wakan Tanka, tenha misericórdia de mim para que meu povo viva!

É por ele que me sacrifico!

 

Enquanto os dançarinos cantavam desta forma, os demais choravam, porque eles eram a nação pela qual os dançarinos iam sofrer. Estes entraram no pavilhão do sol e se colocaram a Oeste. O profeta colocou o crânio de bisão entre os dançarinos e a árvore sagrada, com o osso nasal dirigido para o Leste; a sua frente colocou os três bastões pintados de azul, e sobre este cavalete a mulher colocou o Chanumpa.

Então os cantores entoaram um dos cantos inspirados:

 

Wakan Tanka, tenha misericórdia de nós!

Queremos viver!

Esta é a razão por que fazemos isto.

Dizem que vem uma manada de bisões;

Já estão aqui.

O Poder do bisão vem a nós;

Já está aqui!

Quando o canto cessou, todos romperam em pranto; e durante o resto do dia e toda a noite dançaram.

Esta dança da primeira noite representa o povo perdido na obscuridade da ignorância; porém não são dignos de se encontrar com a luz do Grande Espírito, que brilhará sobre eles quando chegar o dia seguinte; devem sofrer e se purificar antes de serem dignos de morar no Grande Espírito.

No último momento, antes da aurora, a dança se deteve e então os dançarinos ou seus parentes depositaram oferendas fora do pavilhão, no lugar correspondente a cada uma das quatro Regiões.

 

Com a aurora, os dançarinos voltaram a entrar no pavilhão, e o guardião do Chanumpa sagrada ia com eles; o profeta lhe havia pedido que construísse o altar sagrado, mas aquele homem venerável respondeu:

Tu tiveste a visão, Kablaya, e a ti corresponde fazer o altar; mas eu estarei a teu lado, e quando você terminar oferecerei a reza.

E assim foi como o profeta e grande homem santo dispôs o local sagrado; primeiro traçou no solo, a sua frente, um círculo, em cujo centro depositou uma brasa7; em seguida, colhendo algumas ervas aromáticas e erguendo-as sobre sua cabeça, rezou:

Ó Avô Wakan Tanka, esta é tua erva misteriosa, que ponho no fogo; sua fumaça se estenderá por todo o mundo e chegará também até o céu; os povos quadrúpedes e alados e todas as coisas saberão que o é esta fumaça e se alegrarão.

Que esta oferenda ajude a estabelecer um parentesco entre todas as coisas, todos os seres e nós! Que todos eles nos dêem seus poderes para que possamos suportar os sofrimentos que nos esperam. Veja, ó Wakan Tanka, ponho esta erva aromática no fogo e a fumaça se elevará para Ti.

___________

Enquanto punha a erva no fogo cantou este canto de mistério:

Faço fumaça sagrada;

Desta maneira faço fumaça;

Que todos os povos a vejam!

Faço fumaça sagrada;

Que todos estejam atentos e vejam!

Que os seres alados e os quadrúpedes

Estejam atentos e a vejam!

Desta maneira faço fumaça;

Em todo o Universo se alegrarão!

 

A faca destinada a cortar o peito dos dançarinos foi então purificada na fumaça, assim como uma pequena machadinha de pedra e um pouco de terra.

Aquele Que Se Estica pode então fazer o altar, mas antes rezou:

Ó Avô, Wakan Tanka, quero agora converter isto em um lugar sagrado. Quando fizer este altar, todas as aves do ar e todas as criaturas da terra se alegrarão e aparecerão de todas as direções para contemplá-lo. Todas as gerações de meu povo se alegrarão.

Este lugar será o centro dos caminhos dos quatro grandes Poderes. A aurora do dia verá este lugar santo.

Quando tua luz aparecer, ó Wakan Tanka, tudo quanto se move no Universo se alegrará.

Depois de ser oferecida ao Céu e à Terra, se colocou uma pitada de terra purificada no centro do local ritual.

Outro pouco mais foi oferecido ao Oeste, ao Norte, ao Leste e ao Sul, e depositado no lado Oeste do círculo; da mesma forma, se colocou terra nos lugares das demais direções e depois se esparramou por todo o círculo por igual. Esta terra representa aos bípedes, os quadrúpedes, os seres alados e tudo o que há no Universo.

Então o grande homem santo começou a construir o altar neste local sagrado: pegou primeiro um bastão, o dirigiu para as seis Direções e depois, abaixando-o para o solo, traçou um pequeno círculo no centro; este círculo indica a morada do Grande Espírito. Em seguida, depois de haver dirigido novamente o bastão para as seis Direções, traçou uma linha desde o Oeste até a borda do círculo; e do mesmo modo traçou uma linha desde o Leste até a borda do círculo, e repetiu a operação desde o Norte e o Sul.

Construindo o altar desta maneira vemos que todo conduz, e regressa, ao centro; e este centro que está aqui, e que sabemos se encontra em todas as partes, é o Grande Espírito. Kablaya recolheu então um pequeno maço de salvia e, o ofereceu ao Grande Espírito, e rezou:

 

Ó Wakan Tanka, Nos veja! O mais próximo aos bípedes, o chefe dos quadrúpedes, é tatanka, o bisão.

Eis aqui seu crânio seco; ao vê-lo, sabemos que também nós nos converteremos em crânios e esqueletos, e deste modo caminharemos juntos pelo caminho de regresso ao Grande Espírito.

Quando chegarmos ao final de nossos dias, seja misericordioso com nós, ó Wakan Tanka!

Aqui, na terra, vivemos com o bisão e lhe estamos agradecidos por ele, porque ele nos dá nosso alimento e faz bem ao povo. Por esta razão, dou agora erva a nosso parente o bisão. Fez então um pequeno leito de salvia ao Leste do altar e, trazendo o crânio pelos chifres e olhando o Leste, rezou:

 

Dou erva ao bisão;

Que o povo o contemple

Para que viva!

Depois, girando e levantando o crânio para o Oeste, o grande homem santo rezou:

Dou tabaco ao bisão;

Que o povo o contemple

Para que viva!

 

Virando para o Norte, rezou:

 

Dou uma roupa ao bisão;

Que o povo o contemple

Para que viva!

 

E, voltando-se para o Sul, rezou:

Dou pintura ao bisão;

Que o povo o contemple

Para que viva!

 

Então, de pé sobre a salvia, rezou:

Dou água ao bisão;

Que o povo o contemple

Para que viva!

 

Em seguida, o crânio de bisão foi colocado no leito de salvia, olhando ao Leste, e Kablaya lhe colocou umas bolinhas de salvia nas órbitas; depois atou um saquinho de tabaco no chifre que apontava ao Sul, e um pedaço de pele de gamo no chifre que apontava ao Norte, porque esta pele representa a roupa oferecida ao bisão.

Em seguida pintou uma linha vermelha ao redor da cabeça e outra linha vermelha que ia desde a frente ao osso nasal, e enquanto o fazia, disse:

 

Ó bisão, você é a Terra.

Que compreendamos isto e tudo o que é feito aqui! Hechetu welo! Está bem!

Quando terminaram as oferendas ao bisão, os dançarinos deram à volta no pavilhão e se detiveram na entrada, olhando o Leste para saudar ao sol do amanhecer. Veja estes homens, ó Wakan Tanka», pediu o grande homem santo levantando a mão direita, o rosto da aurora encontrará seus rostos; o dia que chega sofrerá com eles. Será um dia sagrado, porque Tu, ó Wakan Tanka, está aqui presente!

Então, no preciso momento em que o sol começou a despontar, os dançarinos cantaram uma melodia inspirada sem palavras, e o profeta entoou um de seus cantos de mistério:

 

A luz do Grande Espírito está sobre meu povo;

Volta brilhante a toda a terra.

Meu povo é feliz agora!

Todos os seres que se movem se alegram!

 

Enquanto os homens cantavam sem palavras e o profeta cantava as fórmulas sagradas, todos dançavam, e ao fazê-lo se movimentavam de maneira que seus rostos olhavam ao Sul, depois ao Oeste, ao Norte, para se deter novamente no Leste, olhando esta vez para a árvore sagrada.

Os cantos e os toques de tambor cessaram e os dançarinos foram se sentar ao Oeste do pavilhão, nos leitos de salvia que lhes haviam sido preparados. Os ajudantes salpicaram os corpos dos dançarinos para tirar a pintura e depois colocaram sobre suas cabeças coroas de salvia e plumas de águia; as mulheres fizeram o mesmo em seus cabelos.

Durante toda a dança do sol levamos coroas de salvia na cabeça, porque é sinal de que nossos pensamentos e nossos corações estão perto do Grande Espírito e de seus Poderes, já que a coroa representa as coisas celestes, as estrelas e os planetas, que estão cheios de mistério.

Kablaya indicou então aos homens como deviam se pintar: a parte superior do corpo, a partir do ventre, de vermelho, e o rosto também de vermelho; o vermelho representa, tudo o que é sagrado, e especialmente a Terra; assim, porque, devemos recordar de que nossos corpos vêm da Terra, e de que voltarão a ela. Temos que pintar um círculo negro ao redor do rosto, porque este círculo nos ajuda a recordar do Grande Espírito, que, como o círculo, não tem fim.

Como eu disse a pouco, há muito poder e o círculo; os pássaros o sabem, visto que voam em círculo e constroem seus ninhos nesta forma; também os coiotes o sabem, porque vivem na terra em buracos redondos. Deve se traçar uma linha negra da testa até entre as sobrancelhas, e outra linha em cada bochecha, assim como no queixo: estas quatro linhas representam os quatro Poderes das quatro Direções.

Pintam-se, também, raias negras ao redor da munheca, do cotovelo, da parte superior do braço e dos tornozelos; deveis saber que o negro é a cor da ignorância, e por tanto estas raias são como os laços que nos atam à terra. Devemos observar, também, que estas raias partem da terra não sobem mais acima dos seios, porque é al onde as correias estão presas ao corpo; estas correias são como raios de luz do Grande Espírito.

Assim, quando tiramos estas correias até nos desprender delas, é como se o Espírito fosse liberado de nossos corpos obscuros. Quando se executou esta dança pela primeira vez, todos os homens iam pintados de esta maneira, e é desde uma época recente que cada dançarino vai pintado de um modo diferente segundo a visão que possa ter tido.

Quando todos terminaram de se pintar, os dançarinos se purificaram com a fumaça da erva aromática e colocaram os diversos símbolos que já descrevi. O dançarino que havia feito voto de carregar os quatro crânios de bisão levava uma forma de bisão sobre o peito, e na cabeça uns chifres feitos com salvia. Quanto os preparativos haviam terminado, os dançarinos se situaram ao pé da árvore sagrada, a Oeste; e, olhando a copa da árvore, levantaram a mão direita e tocaram seus apitos de osso de águia; enquanto, o grande homem santo rezou:

 

Ó Avô Wakan Tanka, inclina-te e dirija-me uma olhada quando elevo a mão paraTi.

Veja aqui os rostos de meu povo.

Tu vês os quatro Poderes do Universo e nos viu agora em cada uma das quatro Direções.

Viste o lugar sagrado e o centro que estamos fixados, e onde vamos sofrer.

Te ofereço todo meu sofrimento pelo bem de meu povo.

Há um bom dia a minha frente, visto que estou frente a Ti, e isto me aproxima Ti, ó Wakan Tanka!

 

É Tua luz a que vem com a aurora e a que atravessa os céus.

Estou de pé sobre tua Terra sagrada.

Tenha misericórdia de mim, oh Wakan Tanka, para que meu povo viva!

 

Então todos os cantores se puseram a cantar em coro:

 

Ó Wakan Tanka!

Tenha misericórdia de mim!

Faço isto para que meu povo viva!

Os dançarinos giraram em círculo para o Leste, olhando para a copa da árvore, a

Oeste; e, levantando as mãos, cantaram:

Nosso Avô Wakan Tanka me deu um caminho que é sagrado.

Indo agora para o Sul e olhando para o Norte, os dançarinos tocaram seus apitos de osso de águia, enquanto os outros cantavam:

Vem um bisão, dizem;

Já está aqui!

O Poder do bisão vem;

Já está sobre nós!

 

Durante este canto, os dançarinos se movimentaram em círculo para o Oeste e ficaram frente ao Leste tocando sem descanso seus estridentes apitos de osso de águia. Depois foram ao Norte e ficaram de frente ao Sul, e finalmente foram novamente ao Oeste e ficaram de frente ao Leste. Então todos os dançarinos romperam em soluços; o profeta recebeu uma correia e dois alfinetes de madeira, foi ao centro e, inclinando-se frente a árvore sagrada, soluçou:

 

Ó Wakan Tanka, tenha misericórdia de mim!

Faço isto para que meu povo viva!

 

Chorando continuamente, foi ao Norte e dali deu a volta completa ao recinto, se detendo em cada um dos vinte oito postes. Levando consigo seus alfinetes e suas correias, os dançarinos fizeram como ele, e quando todos estavam no Norte, de frente ao Sul, o profeta foi novamente ao centro e tocou com as duas mãos a árvore sagrada.

Enquanto os cantores e os tambores aceleravam o ritmo de seus cantos e batidas, os ajudantes se levantaram de um salto, agarraram rudemente ao grande homem santo e o lançaram ao solo; um deles tirou a pele do seio esquerdo do grande homem santo e cravou nele um bastãozinho afiado, e fez o mesmo com o seio direito.

A larga correia de couro cru foi fixada pelo meio ao redor da árvore sagrada, perto do cume, e seus dois extremos foram atados nos alfinetes cravados no peito de Aquele Que Se Estica.

Os ajudantes lhe colocaram em pé rudemente; começou a tocar seu apito de osso de águia e, inclinado para trás e sustentado por suas correias, se pos a dançar. Dançará nesta posição até que as correias se desprendam de sua carne. Quero lhes explicar agora por que utilizamos duas correias que, para dizer a verdade, não são mais que uma bem larga, colocada no centro da árvore e feita com uma tira de pele de bisão cortada circularmente. Isto deve nos recordar que, se bem parece que haja duas correias separadas, estas não são em realidade mais que uma só: só o ignorante vê como múltiplo o que realmente é único.

Esta verdade da unidade de todas as coisas podemos compreender um pouco melhor participando deste ritual e oferecendo nós mesmos em sacrifício. O segundo dançarino foi ao centro e, da mesma forma que o profeta, abraçou a árvore e rompeu em soluços.

Os ajudantes se precipitaram sobre ele e, depois de o atirar rudemente ao solo, perfuraram seus seios e sua espalda direita e esquerda; cravaram em sua carne umas agulhas de madeira as quais ataram quatro correias curtas. Este valente foi então atado entre quatro postes, tão fortemente que não podia se mover para nenhum lado.

Primeiro chorou, não de dor como um menino, mas porque sabia que sofria por seu povo e compreendia a santidade da união em seu corpo das quatro Direções, em cujo centro se convertia realmente. Elevando as mãos para o céu e tocando seu apito, este homem ia dançar até que as correias saíssem de sua carne.

O terceiro dançarino, o que queria levar quatro crânios de bisão, foi ao centro e, depois de abraçar a árvore sagrada, foi a sua vez derrubado e posto de cara ao solo; lhe cravaram quatro bastõezinhos que atravessaram a carne de sua espalda onde colocaram os quatro crânios de bisão.

Os ajudantes se asseguraram de que os crânios estavam presos firmemente; depois deram o apito de osso de águia ao dançarino, que o tocou sem cessar enquanto dançava. Creio que compreendem até que ponto isto era doloroso para ele, porque a cada movimento os chifres pontiagudos dos crânios penetravam sua pele, mas naqueles tempos nossos homens eram valorosos e não mostravam o menor sinal de sofrimento; estavam realmente contentes de sofrer pelo bem de todos.

Parentes e amigos se aproximavam às vezes dos dançarinos e dançavam a seu lado para lhe dar forças, uma moça que amava a um deles pegava uma erva que havia mastigado e a punha na boca deste dançarino para lhe dar forças e acalmar sua sede. A batida dos tambores, os cantos e a dança nunca paravam, e se podia ouvir, dominando aos demais sons, o som agudo dos apitos de osso de águia. O quarto homem, o que havia formulado o voto de dar doze pedaços de sua carne, avançou e se sentou ao pé da árvore, ao que acariciou com as duas mãos; os ajudantes pegaram uma agulha talhada em um osso e em diversos lugares levantaram a carne, da que cortaram seis pedacinhos no lado direito e outros seis no lado esquerdo. Esta carne foi deixada como oferenda ao pé da árvore, e o homem se pos em pé e se juntou à dança com os demais.

De igual modo, o quinto dançarino sacrificou oito pedaços de sua carne; o sexto deu quatro da sua e o sétimo sacrificou dois. Por último, a mulher abraçou a árvore, se sentou e disse entre lágrimas:

Pai Wakan Tanka, neste único pedaço de carne me ofereço a Ti, a teus Céus, ao Sol, à Lua, ao Luzeiro da Aurora, aos quatro Poderes e a todas as coisas.

Continuaram dançando, e as pessoas aclamavam ao profeta, lhe dizendo que tirara a mais forte das correias, o qual fez força até que por fim uma delas se soltou, e todos gritaram hi ye!

Caiu, mas lhe ajudaram a se levantar e continuou dançando até que a outra correia se rompeu, caiu novamente, mas se pôs em pé e levantou as mãos ao céu, e então todo o mundo lhe aclamou com grandes vozes. Lhe carregaram até que chegou ao pé da árvore sagrada, onde descansou em um leito de salvia; tirou da carne palpitante de seus seios e arrancou doze pedaços, que pôs ao pé da árvore. Os homens de medicina puseram uma erva curativa sobre suas feridas e o mudaram para um lugar na sombra onde ele descansou uns instantes; depois se levantou e continuou dançando com os demais.

Ao final, o homem que havia dançado muito tempo com os quatro crânios perdeu dois, e então o profeta ordenou que lhe cortassem a pele de modo que os ouros dois crânios se desprenderam.

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Mas apesar de se libertar dos quatro crânios, este valente continuou dançando. Então, o que havia dançado no centro dos quatro postes rompeu duas de suas ataduras; o profeta disse que já havia suportado bastante, e com uma faca lhe cortaram a pele, de modo que se viu livre das outras duas ataduras,

Estes dois homens ofereceram então cada um doze pedaços de sua carne a árvore sagrado, e todos os dançarinos e muitas outras pessoas prosseguiram a dança até que o sol estava a ponto de se por.

No momento que precede ao por do sol foi levado um Chanumpa aos dançarinos e aos cantores como sinal de que a dança havia terminado e de que podiam fumar. Então os dançarinos e o guardião do Chanumpa se sentaram a Oeste do pavilhão, e a mulher pegou em suas mãos o Chanumpa que havia ficado frente a ela; levantando a haste do Chanumpa, caminhou ao redor do crânio de bisão e se deteve frente ao guardião do Chanumpa; e rezou assim:

 

Ó Pai santo, tenha piedade de mim!

Ofereço meu Chanumpa ao Grande Espírito!

Ó Avô Wakan Tanka, ajude-me!

Faço isto para que meu povo viva e para que cresça conforme ao mistério.

A mulher ofereceu três vezes o Chanumpa ao guardião, e na quarta vez o entregou.

How, disse o guardião ao receber o Chanumpa; depois se distanciou e ficou embaixo da árvore sagrada, ao Norte, e gritou quatro vezes: Hi-ey-hey-i-i!

 

E rezou assim:

 

Avô Wakan Tanka, Tu estás mais perto de nós que qualquer outra coisa, hoje viste quanto fizemos.

Agora está acabado, nossa tarefa está terminada.

Hoje um ser bípede levou a cabo um ritual muito sagrado que Tu ordenaste realizar. Estes oito homens aqui presentes Te ofereceram seus corpos e suas almas. Com seu sofrimento enviaram suas vozes para Ti; inclusive ofereceram uma parte de sua carne, que está agora ao pé desta árvore sagrada. O favor que eles Te pedem é que seu povo caminhe pelo caminho da vida e que cresça segundo o mistério.

Veja este Chanumpa que Te oferecemos, junto com a Terra, os quatro Poderes, e todas as coisas.

Sabemos que somos parentes, que formamos uma unidade com tudo o que há no Céu e na Terra, e sabemos que todas as coisas que se movem são um povo como nós. Todos desejamos viver e crescer segundo o mistério.

O luzeiro do amanhecer e a aurora que vêm com ele, o sol da noite (a lua, hanhepiwi) e as estrelas do céu tem estado todos aqui reunidos.

Tu nos ensinou nosso parentesco com todas as coisas e todos os seres, e Te damos graças por isso, agora e sempre. Que sejamos continuamente conscientes deste parentesco existente entre os quadrúpedes, os bípedes e os voláteis.

Que todos possamos nos alegrar e viver em paz! Veja este Chanumpa, que é o que o quadrúpede trouxe para a nação; com ele temos cumprido sua vontade. Ó Wakan Tanka, colocaste a teu povo em um caminho sagrado; que possamos segui-lo com passo firme e seguro, segurando as mãos de seus filhos, e que os filhos de seus filhos caminhem também segundo o mistério. Tenha piedade, ó Wakan Tanka, das almas que retornaram à terra e partiram. Que estas almas sejam dignas de caminhar pelo grande caminho branco que estabeleceste!

Vamos acender e fumar o Chanumpa, e sabemos que esta oferenda e muito boa. A fumaça que se elevará se estenderá por todo o Universo, e todos os seres se alegrarão.

Então os dançarinos se sentaram a Oeste do pavilhão e o guardião tirou o selo do fornilho do Chanumpa e o colocou sobre uma costela purificada de bisão. O Chanumpa foi aceso com uma brasa e, depois de oferecê-lo às seis Direções e de dar umas baforadas, o guardião o passou a Kablaya, que a sua vez o ofereceu entre lágrimas, deu umas baforadas e o passou à pessoa que tinha ao lado.

Cada um dos homens, depois de oferecer r fumar, o devolvia ao grande homem santo, que o oferecia ao homem mais próximo. Uma vez todos fumaram, o profeta depositou lenta e cuidadosamente as cinzas no meio do altar e rezou: Ó Wakan Tanka, este lugar sagrado é teu. Nele foi realizado tudo Nos alegramos por ele.

Dois ajudantes puseram então sobre o altar umas cinzas do fogo de mistério situado a Leste do pavilhão; de igual modo, se colocou sobre o altar barro purificado, e depois todas as grinaldas, as peles, as plumas e os símbolos utilizados na dança foram amontoados no centro do local sagrado.

Isso foi feito porque estas coisas eram demasiado sagradas para ser conservadas, e deviam regressar à terra. Só se conservaram o vestido de pele de bisão e os apitos de osso de águia; estes objetos serão sempre considerados como particularmente veneráveis, já que foram empregados na primeira grande festa da dança do sol. Encima do monte formado pelos objetos utilizados no ritual se colocou o crânio de bisão; este crânio nos recorda a morte e também nos ajuda a recordar que aqui se consumou um ciclo.

Então todos se alegraram, e as crianças foram autorizadas a brincar e dar trotes nos mais velhos, mas ninguém se preocupou com isso e não as castigaram, porque todo mundo estava contente. Mas ainda, os dançarinos não haviam terminado: pegaram suas roupas de pele de bisão e voltaram à tenda dos preparativos; uma vez ali, tiraram suas roupas com a exceção do tapa sexo e entraram na cabana do inipi, salvo a mulher, que estava encarregada de cuidar da porta.

Se introduziram as cinco pedras e se fumou o Chanumpa por turno; mas antes de fumar os homens o apoiavam em uma das pedras. Se fechou a porta e o grande homem santo disse o seguinte: Parentes, desejo dizer umas palavras. Escutem com atenção!

Hoje fizeram uma coisa cheia de mistério, porque deram vossos corpos ao Grande Espírito. Quando regressarem com os vossos recordem sempre de que graças a este ato foram santificados.

No futuro vocês serão os guias de vosso povo, e deveis ser dignos deste piedoso dever. Sejam misericordiosos com os vossos, sejam bons com eles e ame-os! Mas recordem sempre disto: que vosso parente mais próximo é vosso Avô e Pai Wakan Tanka, e que depois Dele vem vossa Avó e Mãe a Terra.

Se derramou água sobre as pedras quentes, e quando o vapor subiu enchendo a pequena cabana e nela fazia muito calor, se abriu a porta e se introduziu água. Se molhou erva aromática na água e se aplicou aos lábios dos dançarinos, e esta foi toda a água que naquele momento puderam receber.

Se passou o Chanumpa por todo o círculo, se fechou a porta e novamente o profeta se dirigiu aos homens:

Graças a vossas ações, hoje reforçaram o círculo de nossa nação. Fizeram um centro sagrado que estará sempre com vocês, e criaram um parentesco mais estreito com todas as coisas do Universo. Novamente se derramou água sobre as pedras, e enquanto o vapor subia, os homens cantaram.

Quando se abriu a porta pela terceira vez, os homens foram autorizados a beber um gole de água, e o Chanumpa percorreu o círculo como antes. De novo se fechou a porta, e enquanto das pedras se elevava o vapor, todos os homens cantaram:

 

Envio uma voz a meu Avô!

Envio uma voz a meu Avô!

Escuta-me!

Junto com todas as coisas do Universo

Envio uma voz ao Grande Espírito!

O profeta disse:

Os quatro caminhos dos quatro Poderes são vossos parentes próximos.

A aurora e o sol do dia são vossos parentes.

A estrela da aurora e todas as estrelas dos céus sagrados são vossos parentes.

 

Recordem sempre disto. A porta foi aberta pela quarta e última vez, e os homens beberam tanta água quanto desejaram, e quando terminaram de beber, Aquele Que Se Estica disse estas últimas palavras: Viram agora quatro vezes a luz do Grande Espírito. Esta luz estará sempre com vocês.

Recordem de que há quatro passos que conduzem ao final do caminho sagrado13. Mas chegarão até ali! Está bem!

Está terminado! Hechetu welo!

Os homens voltaram então para a tenda dos preparativos, onde lhes foi servido muita comida, e todo mundo estava feliz e contente. Havia se realizado uma grande coisa; nos futuros invernos, a vida da nação receberia muita força graças a este grande ritual.

 

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